sexta-feira, 24 de outubro de 2008

COVARDIA NÃO É SÓ NO MATO GROSSO DO SUL

Um aparato de guerra persegue O Cacique Tupinambá da Serra do Padeiro - BA

Notícia de Ontem do jornal A Tarde - BA 23/10/2008 às 23:06

Cacique Babau escapa ao cerco em Buerarema

Denise Araújo, da Sucursal Itabuna, e redação Jornal A Tarde

A Polícia Federal está em perseguição a Rosivaldo Ferreira da Silva, o cacique Babau, para cumprir um mandado de busca e apreensão expedido pelo juiz federal da Vara Única de Ilhéus, Pedro Holidey. A prisão foi determinada porque o índio é acusado de tentativa de cárcere privado e danos causados a uma viatura. Os policiais, em torno de 30 homens, fizeram uma barreira no início da estrada que dá acesso à Aldeia dos Tupinambás, na Serra do Padeiro, no município de Buerarema (a 447 km de Salvador, no sul da Bahia).

Na operação, além dos policiais da barreira, a PF usou vários homens em exploração pelo mato, além de varredura com helicóptero. O número de agentes não foi divulgado. Foram sete horas de ação para o cumprimento do mandado, mas o cacique não foi encontrado. Embora a assessoria de imprensa da PF tenha emitido boletim afirmando que "não houve qualquer confronto na região na data de hoje [quinta-feira, 23], tendo transcorrido dentro da normalidade todas as diligências", depoimentos de alguns índios dão conta de que os agentes usaram de violência para cumprir o mandado de busca e apreensão, ao revistar suas casas.

Na manhã desta quinta-feira, os policiais se dirigiram ao local, objetivando apurar o incidente ocorrido na segunda-feira, 20, que, segundo informações da PF, resultou em agressão contra os policiais e a destruição do veículo. Na ocasião, os agentes tinham ido à Serra do Padeiro para cumprir pedido de reintegração de posse de terras. Houve confronto e os agentes reagiram com balas de borracha para conter os índios.

A PF informou que, ao realizar as investigações pela manhã, encontrou o irmão do cacique Babau, de nome Jurandir da Silva, reconhecido como um dos agressores durante a ação de reintegração de terras na segunda-feira. Ele foi levado para a sede da Polícia Federal em Ilhéus para depoimentos. Magnólia Silva, também irmã do cacique, disse que ficou espantada com a ação dos agentes nesta quinta. "Eles invadiram nossa casa e reviraram tudo. Carregaram espetos de assar carne e algumas facas e facões". Segundo informações de Rômulo Siqueira, responsável pelo escritório regional da Fundação Nacional dos Índios - Funai, o clima continuou tenso no local, mesmo após o conflito. Os índios, em protesto, resolveram obstruir estradas.

Haroldo Heleno, membro do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), observa que a situação na região é muito preocupante. "Desejamos que haja uma rápida regularização do problema, através da entrega do relatório de identificação, que permite a regularização das terras da tribo indígena Tupinambá". Ele acha que o caos poderia ser evitado se a Funai tivesse providenciado com mais urgência a entrega do documento.


PRISÃO - O cacique Babau foi preso no começo deste ano (17 de maio), quando participava de uma reunião na sede da Funai de Ilhéus. Ele ficou recluso no Presídio Ariston Cardoso, em Ilhéus, por dois dias. O motivo da detenção foi desacato à autoridade e por não ter comparecido a audiência para prestar esclarecimentos sobre a apreensão de quatro caminhões, um carro patrol e uma pá-carregadeira, apreendidas na aldeia por meses.


Segundo os índios, os veículos, que prestavam serviço para a prefeitura de Buerarema, foram apreendidos porque retiravam cascalho das terras indígenas para terraplanagem, mas não havia benefícios em troca. Na ocasião, integrantes da tribo fizeram plantão em frente ao presídio, pedindo a soltura do cacique.


Comentário:
Quanta covardia. Será que a Polícia Federal não tem mais o que fazer.Por que não investiga os contrabandistas de bebidas junto ao cais?

Heitor Kaiowá

domingo, 19 de outubro de 2008

Massacre: Raposa Serra do Sol - texto de João Américo Peret

Massacre: Raposa Serra do Sol
(Nove índios e seis não índios são feridos a bala)
João Américo Peret (1) -


Como indigenísta há 58 anos, não posso ficar calado. Lendo uma entrevista do colega sertanista Orlando Villas Boas, de 1980, vemos que os massacres continuam depois de 40 anos de denúncias sistemáticas. Ele faz referencia a massacre Txukarramãe no Xingu: - “Essa matança – segundo Villas Boas - foi à gota d’água. Não são humildes lavradores cuidando de rocinhas para sua subsistência. O que há, na verdade, é índio de um lado e pistoleiros fortemente armados de outro. Em Bang-Bang (nome de povoado) - e não é por acaso tal denominação do lugarejo – ali vivem dezenas de jagunços permanentemente à disposição de fazendeiros para o que der e vier.”

Os motivos também são os mesmos: terras. Como sertanista da Funai, realizei um Inquérito Administrativo em Roraima, em 1968. Na ocasião, visitei várias malocas, e na maloca do Limão conversei muito com o tuxaua Felismino Pereira. Logo que me identifiquei, ele indagou: “É verdade que o SPI acabou? Que deram a Fazenda São Marcos, para o Pastor americano Sr. Haroldo Burns? Sabia que isso facilitou a invasão das nossas terras?”. O SPI não acabou. Só trocou de nome, hoje é Funai.

Ninguém pode dar terras federais como a fazenda de São Marcos. Ela foi entregue aos parentes de vocês com 12 mil cabeças de gado, em 1917. “Pois o IBRA disse que o SPI acabou e registrou nossas terras para os fazendeiros, para os padres italianos, para o pastor americano... Nós também corremos para registrar as nossas malocas para não perder tudo: Essa maloca do Limão é minha, tenho o registro; a maloca da Raposa, é do Abel e Gabriel; a maloca Perdiz, é do Damásio Galé; a maloca Chuminá, é do Lino Antônio Evaristo; a maloca Aratanha, é do Duarte Aratanha...”. Provavelmente, o prefeito de Pacaraima foi um dos fazendeiros que invadiu ou comprou de quem invadiu a terra dos índios.

Vejo que passados 40 anos, o massacre analisado pelo Orlando Villas Boas, se repete em Roraima, com o uso de jagunços. Orlando Villas Boas também comentou: “A Funai é sempre acusada indiscriminadamente. Mas quem faz alguma coisa pelo índio ainda é ela. As outras entidades, que se imiscuem na assistência ao índio vivem de denúncias e se locupletar do sangue suor e lágrima dos índios. E querem salvar o índio, sem sequer, conhecerem o Parque do Xingu. É muito fácil salvar o índio de dentro de um apartamento, com um copo de uísque na mão. O nosso índio está desaparecendo, exatamente, na voragem de seus salvadores. Acredito na Funai, sei que tem seus erros e até péssimas administrações passadas, mas continuo acreditando”.

Na opinião do general Augusto Heleno, comandante militar da Amazônia: - “A política indigenísta brasileira está entregue a Organizações Não-Governamentais (ONG’s), e não consegue atender a ausência do Estado (Funai). Nas aldeias, proliferam as criações de organizações e muitas arrancam para si vultosas quantias do orçamento destinado à saúde indígena; outras interessadas em catequizar e evangelizar esses povos. Há no meio militar receio de que entidades ligadas às ONG’s estrangeiras estejam de olho não só nos índios, mas nas riquezas florestal e mineral da Amazônia. Para o general Heleno (EB), a política indigenísta brasileira é Lamentável, para não dizer caótica”. Conclui o General. Como indigenísta ex-sertanista do SPI/FUNAI, 1949-1970, participei de várias sindicâncias e inquéritos administrativos sobre massacre e espoliações dos povos indígenas. Mas nunca vi nenhum dos envolvidos nas tramas, punidos. Nossas leis. Que leis?... manipuladas pela politicagem favorecem a rapinagem. Quanto a proliferação de ONG’s nas áreas indígenas, até o presidente da Funai já se declarou favorável. E quando você faz contato com ONG’s indígena, é quase sempre atendido por jovens graduadas em antropologia, sociologia, administração etc, que amasiada com líderes indígenas, administra a ONG’s, numa cidade, em causa própria”. Tudo isso é muito esquisito, sou indigenísta de 82 anos, trabalhar sob a égide de Rondon, Gama Malcher, Heloisa Torres, fui colega dos Irmãos Villas Boas, Apoena e Francisco Meireles, Gilberto Pinto, Cícero Cavalcante e outros. E acompanhei vários antropólogos em pesquisas de campo.

(1) João Américo Peret, indigenísta, escritor, jornalista, acadêmico.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

ELEIÇÕES - APLAUSOS AOS ÍNDIOS!!! - Texto de João Américo Peret

Foi com muita alegria que recebi a mensagem do M. Marcos Terena - Membro de la Cátedra Indígena Itinerante, Presidente del Comitê Intertribal - ITC.

Acredito que os amigos que estão com o Grande Espírito no Céu: Rondon, Malcher, Heloisa Torres, Darcy Ribeiro, Meireles, Gilberto Pinto e tantos outros que deram o sangue, suor e lágrimas pela causa indígena, estejam enviando raios cósmicos do SOL para abrir a mente desses irmãos indígenas que aos poucos despertam para a política brasileira, e irão melhorar a vida das populações carentes dessa Pátria Amada.

Peret, indigenísta

João Américo Peret - Indigenista/Escritor/Jornalista

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Indígenas Eleitos - Texto de Marcos Terena

COMITÊ INTERTRIBAL - ITC

http://www.tvintertribal.com.br/

Prezados irmãos indigenas e demais companheiros de luta,

Com grande alegria informamos que diversos lideres indigenas de norte a sul do País, foram eleitos para funçoes politicas estrategicas dentro de suas regiões como Prefeitos, Vice-Prefeitos e Vereadores. Como parte do movimento indigena Brasileiro, temos que estar contentes com isso, pois sabemos que a luta municipal e regional é muito maior que de nivel federal, principalmente pelo ranço da discriminaçao e preconceito latente.

Este sem dúvida, é o primeiro passo para que nossas aldeias, nossos Povos comecem a pensar na importância do voto indigena, já que depois do carnaval, começam as campanhas para Presidente da República, Governo do Estado, Senador, Deputado Federai e Deputado Estadual.

Entao parabens ao espirito de luta dos eleitos e que tem como missao, trabalhar para construir nossa representaçao em nivel federal.

JEREMIAS XAVANTE - MT;
IURARU KARAJÁ - TO;
DARCI JAWAÉ (TO);
CARLINHOS MEINAKU (XINGU-MT);
DIVA MAXAKALI (MG);
KARAJÁ PATAXÓ (BA);
DEZINHO FULNI-Ô (PE);
ALEXANDRE XERENTE (TO);
IVAN XERENTE (TO);
GENILTON PARESI (MT);
PERCEDINO TERENA (MS);
PEDRO GARCIA (AM) - PREFEITO DE S. GABRIEL DA CACHOEIRA;
ANDRÉ BANIWA (AM) - VICE-PREFEITO DE S. GABRIEL;
MECIAS SATERÉ-MAWÉ (AM) - PREFEITO DE BARREIRINHA.

Tem um certo Paulinho Paiakan, eleito vereador na cidade de Avaí/SP, perto da aldeia de Araribá, mas nao é com certeza o Paiakan Kayapó...

E ainda que, o Quartiero, não se reelegeu em Roraima.

Parabéns a luta dos Povos Macuxi, Wapichana, entre outros.... Qualquer coisa para acrescentar e confirmar todos podem entrar non site http://www.justicaeleitoral.gov.br/. Grande abraço a todos!

M. Marcos Terena
Miembro de la Cátedra Indigena Itinerante Presidente del Comitê Intertribal - ITC

E se fosse o seu pai?




Vítima dos conflitos na TI Raposa Serra do Sol após ser atacado por jagunços

O CIMI e a Declaração da ONU - Texto de Denis Rosenfield

Declarações são desencontradas e os números servem mais para encobrir do que para esclarecer os fatos e as intenções dos agentes políticos. O julgamento em curso sobre a Raposa Serra do Sol coloca questões relativas à soberania nacional que devem ser seriamente consideradas. Relegá-las a segundo plano seria um grave equívoco. O Itamaraty assinou a Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas da ONU, contrariando pontos da própria Constituição brasileira. O Ministério das Relações Exteriores, por sua vez, procura se esquivar, afirmando, contra todas as evidências, que essa Declaração não precisaria ser ratificada pelo Congresso Nacional, quando é disso, precisamente, que se trata. Das duas, uma: ou a Declaração passa a ter vigência no País, independentemente de ser ratificada pelo Congresso, situando-se acima da Constituição brasileira, ou ela não tem nenhuma validade e, neste caso, não se sabe por que o Itamaraty a teria assinado. Uma simples assinatura sem nenhum valor? Custa a acreditar.

Da mesma maneira, o processo de identificação e demarcação de terras indígenas em Mato Grosso do Sul apresenta números conflitantes, que parecem corresponder a essa mesma estratégia de assinar uma coisa e dizer outra, como se o cidadão não merecesse o respeito à informação. Nesse Estado, as portarias do Incra abrangem 26 municípios (já aumentados, na semana passada, para 28), correspondendo a aproximadamente um terço do seu território. Esta é a realidade. O resto é tergiversação. Diante das reações suscitadas, certos antropólogos desinformados falam em 600 mil hectares e outros, em 3 milhões. Nem eles se entendem. O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) calcula em torno de 4 milhões de hectares. Segundo o que foi publicado no Diário Oficial, a área a ser demarcada chega a aproximadamente 12 milhões de hectares, podendo atingir qualquer propriedade e qualquer município. A insegurança jurídica é total, prejudicando seriamente o Estado. Eles desinformam, em vez de informar. A quem interessa essa confusão?

Em 17 de setembro de 2007, o Cimi, órgão vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), fez uma contundente defesa da aprovação da Declaração pela Assembléia-Geral da ONU, que ocorreu no dia 13 do mesmo mês - logo, apenas quatro dias depois de aprovada. Em seus próprios termos: "A Declaração se torna agora um importante instrumento na luta dos povos indígenas pela afirmação de seus direitos. A Declaração orienta os Estados a protegerem os territórios indígenas e os recursos que existirem nestes. Além disso, a ONU recomenda que nenhuma ação deve ocorrer em terras indígenas sem consentimento prévio e informado dos povos. As formas de consultá-los devem ser de acordo com a organização de cada povo."

Constata-se o papel propriamente político da Declaração enquanto instrumento a ser utilizado em cada país pelas organizações que se colocam como representantes dos povos indígenas. No caso em questão, o Cimi se põe na situação desse interlocutor, ocupando o lugar de mediador, embora, na verdade, atue diretamente na nomeação e nas próprias ações da Fundação Nacional do Índio (Funai). É como se a Funai, de órgão do Estado brasileiro, passasse a funcionar como órgão da ONU e de seus intermediários, para além da soberania nacional. Mais especificamente, é recomendado que toda ação dentro dos territórios considerados indígenas seja feita somente com o consentimento desses povos, o que vem a significar: com o consentimento do próprio Cimi e de outros órgãos atuantes nessas terras e nesses territórios. Ou seja, o Cimi e as ONGs, com a intervenção da Funai, terminariam se colocando como os verdadeiros governantes dessas terras e desses territórios, apesar de utilizarem a figura retórica de que são os próprios índios que expressam, assim, a sua vontade.

A Declaração, enquanto discurso político, passa a orientar a ação do Cimi, das ONGs e da própria Funai, independentemente de ela não ter sido votada e aprovada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado. Esses interlocutores, esses mediadores políticos, no entanto, começam a atuar como se ela já fizesse parte do arcabouço constitucional brasileiro, num evidente contra-senso e desrespeito à democracia representativa. Eis o Cimi novamente se manifestando: "O Brasil votou a favor da Declaração, da mesma forma que todos os países da América do Sul, à exceção da Colômbia, que se absteve. A partir de agora, a Declaração deve ser usada como referência no desenvolvimento da política indigenista brasileira." Ou seja, não seriam mais a Funai e o próprio Estado brasileiro que ditariam as normas da política indigenista, mas uma Declaração da ONU, instrumentalizada pelo Cimi. Na verdade, o Cimi e as ONGs, com o beneplácito de membros da Funai afinados com essa posição, passariam a ditar a política indigenista nacional, o que já é de certa maneira feito em Mato Grosso do Sul e Roraima.

Para além da soberania nacional e do ordenamento constitucional, o Cimi já defende a idéia de que essa Declaração deve servir como orientação para o Poder Judiciário. Observe-se, novamente, o contra-senso. A Declaração não é lei nem norma constitucional e, no entanto, essa ala da Igreja, respaldada pelos movimentos ditos sociais, procura fazer como se ela fosse uma norma situada acima da própria Constituição brasileira, valendo para além e por cima dela. "A Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas também pode, a partir de sua aprovação (pela ONU), ser usada pelo Poder Judiciário como referência para suas decisões." O Judiciário, ainda segundo essa ótica, deveria proferir sentenças não apoiadas no texto constitucional brasileiro, mas numa Declaração da ONU, sustentada pelo Cimi, isto é, pela própria Igreja, por intermédio dessa sua ala radical, que ditaria as normas do Estado brasileiro.


Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia na UFRGS. E-mail:

Eu Não Aceito Ser Co-Autor de Genocídio - Texto de Luiz Carlos Azenha

Estou no Colorado para a Convenção que indicará Barack Obama oficialmente candidato do Partido Democrata à Casa Branca. Porém, antes de entrar neste assunto pretendo falar de outro, que julgo mais importante: a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na quarta-feira, em que os juízes decidirão se consideram ou não inconstitucional a demarcação da reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima.

Quando fui convidado pela TV Cultura para fazer um documentário a respeito não conhecia quase nada sobre o assunto. Passei dez dias entre Boa Vista, a reserva e Brasília entrevistando dezenas de pessoas a respeito. Li muito. Discuti o assunto com especialistas. O material que coletei foi entregue a uma equipe da TV paulista, que fez um belíssimo trabalho de edição. O documentário já foi ao ar duas vezes. Acredito que oferece um panorama a respeito da polêmica, em que vários pontos-de-vista foram contemplados. Falaram tanto o líder dos arrozeiros, Paulo César Quartiero, quando os representantes dos indígenas.

É um assunto complexo, que merece reflexão. Numa entrevista que dei ao Jornal da Cultura eu mesmo disse que não se deve tratar deste assunto com o coração -- ou o figado, como preferirem -- mas com a cabeça.

Porém, não é o que tenho visto desde que estive em Roraima. Infelizmente tenho testemunhado algo que me surpreende: o racismo, o preconceito e o desprezo de muitos brasileiros pelos indígenas. Os próprios indígenas costumam dizer que isso se deve à desinformação. É o que ouvi, por exemplo, da advogada que os representa no STF, Joênia Wapixana, a primeira indígena que se formou em Direito no país.

Talvez seja, de fato, desinformação. Mas, sinceramente, acredito que é algo mais perverso: é racismo. É intolerância. É desprezo pelo diferente, por algo que no inconsciente coletivo do brasileiro representa "atraso", um alvo conveniente contra o qual dirigimos nosso ressentimento pelos fracassos do Brasil de brancos, negros e europeus.

São freqüentes, neste e em outros endereços da internet, as referências ao tratamento que os Estados Unidos deram aos indígenas, como se o genocídio cometido em outros lugares fosse justificativa para o genocídio no Brasil. "Se os americanos fizeram, nós também podemos fazer", argumentam. É vergonhoso, para dizer o mínimo. Quando se trata dos indígenas, queremos ser tão criminosos quanto os americanos? É isso? Ou nós seremos melhores do que eles?

A ignorância é, de fato, a maior inimiga dos indígenas brasileiros. Os brasileiros brancos ignoram a riqueza étnica do País, ignoram as condições em que vivem os indígenas, ignoram as leis que amparam as demarcações. E os ignorantes são muito mais suscetíveis às campanhas de desinformação movidas contra os indígenas, que tiram proveito do preconceito existente na sociedade brasileira. "Índio não dá audiência", costumava dizer a diretora de um programa da TV Globo quando eu trabalhava na emissora, supostamente apoiada em pesquisas de opinião. "Índio é bêbado e vagabundo", costumava dizer um parente meu, testemunha de conflitos fundiários no interior do País. As manifestações de racismo explícito envolvendo violência se cristalizaram no caso do índio Galdino Pataxó, aquele que foi queimado por jovens brancos de classe média alta em Brasília.

A violência institucional contra os indígenas não é uma novidade no Brasil. Foi política de estado o confinamento dos indígenas em territórios exíguos, verdadeiros campos de concentração em que se misturaram povos de diversas etnias, inclusive de famílias inimigas. Uma visita às aldeias da região de Dourados, no Mato Grosso do Sul, dará ao leitor uma idéia do que estou falando.

Lá, milhares de indígenas foram concentrados em pequenos territórios, sem assistência médica, educação ou apoio para cultivar a terra. Aos jovens resta mendigar nas ruas das cidades próximas ou trabalhar como bóias frias. Os homens deixam as reservas em busca de trabalho temporário nas lavouras. As mulheres ficam sós para cuidar dos filhos. E o Brasil só se dá conta dessa situação calamitosa quando bebês começam a morrer ou jovens, sem perspectiva, cometem suicídio.

A Constituição de 1988 reconheceu o direito dos indígenas à terra e obriga o Estado brasileiro a garantir a eles o espaço necessário para a sobrevivência. É óbvio que a população indígena cresce e que as demarcações precisam levar em conta isso. Justamente para evitar que situações como a verificada em Mato Grosso do Sul se repitam.

Não estamos tratando de um favor, mas do cumprimento da lei. O estereótipo de que os índios são "bonzinhos", ou "selvagens" ou "inocentes" ou "manipuláveis" é só isso: um estereótipo.
Perguntem à advogada Joênia Wapixana e ela diz: "Não é pelo fato de que um índio fala português ou usa um laptop que ele deve abrir mão dos seus direitos constitucionais".
Estes são direitos coletivos ao usufruto da terra.

Terra indígena, como já escrevi aqui, é terra da União, ou seja, do Brasil, de toda a sociedade brasileira. Ao reconhecer o direito de uso da terra o Brasil não está abrindo mão de sua soberania ou "entregando" terra. Está reconhecendo a sua obrigação de preservar as diferentes etnias e de conceder aos indígenas o usufruto de território essencial para sua preservação.

Pessoalmente, entre conceder o usufruto da terra aos indígenas ou aos arrozeiros eu, Azenha, prefiro conceder aos indígenas. Sei que eles vão preservar a terra muito melhor do que agricultores, cujo principal objetivo é o lucro pessoal. Eu prefiro sustentar 500 indígenas do que uma família de classe média alta branca que se apropriou de terras públicas, tem outras propriedades e pode muito bem produzir fora de áreas demarcadas.

É disso que o STF vai tratar: de uma disputa POR TERRA entre alguns fazendeiros brancos e milhares de indígenas. De uma disputa que já causou muitas mortes. Sabe quantas? Vinte e uma, na contabilidade dos indígenas. Nenhum homem branco. Todos os 21 mortos são indígenas. Todos morreram em conflito fundiário desde que a FUNAI começou o trabalho de reconhecimento da Raposa/Serra do Sol. Quantas vezes a mídia corporativa brasileira deu espaço para as teorias conspiratórias da extrema-direita, que em nome de beneficiar o agronegócio e as mineradoras tenta transformar os indígenas em uma ameaça à soberania?
Essa ameaça inexiste. Todas as terras indígenas pertencem à União e a presença de autoridades brasileiras nelas é garantida por decreto. A fantasia dos "vazios demográficos" não é mais que isso: uma fantasia de militares de extrema-direita que, com o fim da guerra fria, procuram "inimigos" que justifiquem a Doutrina de Segurança Nacional, uma doutrina que eles aprenderam com os americanos e que exige a existência de "inimigos internos".

É irônico que os "inimigos internos" de hoje sejam os indígenas, agora supostamente aliados dos americanos e europeus.

Não é nada irônico que gente que se diz "de esquerda" ou "progressista" se junte à extrema-direita para fazer dos indígenas "inimigos".

Por não terem voz na mídia, nem na academia, nem nos partidos, nem no Congresso, os indígenas são um inimigo conveniente.

São a garantia de que nós, brasileiros brancos, que nos sentimos tão pequenos ou derrotados diante de americanos, suecos, franceses e argentinos, podemos finalmente dizer que "ganhamos uma".

"Ganhar uma" sobre os direitos dos indígenas, em minha opinião, é genocídio. Não a limpeza étnica clássica, evidente, de grandes proporções.

A limpeza étnica malandra, nas sombras, a conta-gotas, justificada pomposamente por tribunais, jornalistas, partidos e políticos com citações jurídicas e a "produção" de fatos consumados a posteriori para forçar a "desdemarcação".

Os brasileiros brancos querem, aos poucos, matar os indígenas?

Não contem comigo. Não aceito ser co-autor de genocídio.

PS: Por um erro meu, esse texto foi publicado de forma incompleta. Os primeiros comentários foram feitos com base numa versão menor, mas o sentido do texto permanece o mesmo. Peço desculpa ao leitores e comentaristas.

Luiz Carlos Azenha

Blog Vi o Mundo, do jornalista Luiz Carlos Azenha, Opinião, 26/08/2008.

Nas Mãos da Justiça - Texto de Marina Silva

Há coisas em nossa casa que prezamos muito. Mas, se um incêndio ameaçá-la, deixamos tudo de lado e nos agigantamos para chegar até o quarto e salvar os filhos.

Alguns temas da vida nacional são comparáveis ao quarto dos filhos porque guardam o fundamento, o profundo, o que separa o essencial do apenas importante. Às vezes não é fácil percebê-los, pois falta sensibilidade e sobra pragmatismo. A diversidade cultural é um deles. Está no cerne da identidade brasileira e, de alguma forma, nos orgulhamos dela e a exibimos em expressões artísticas, esportivas, em imagens, natureza e história.

Em algumas situações, porém, acaba-se salvando o enfeite da sala em prejuízo do quarto dos filhos. E, nesse passo, vamos comprometendo nossa continuidade, perdendo elos que nos tornam únicos e definem nosso peculiar pertencimento no mundo. Digo isso a propósito da proximidade de momento de enorme significado para o país: a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol em área contínua. Não nos iludamos; está em jogo não apenas uma pendenga entre índios e não-índios na sociedade de Roraima. Quem está na berlinda são todos os brasileiros, em sua capacidade de proteger, pelas mãos do Estado, a preciosa esfera dos valores culturais e imateriais da nação.

A população de Roraima não chega a 400 mil habitantes. Para os cerca de 350 mil não-índios há quase 11 milhões de hectares de terras disponíveis, diz estudo do Instituto Socioambiental. Comparando, Pernambuco tem 9,8 milhões de hectares para cerca de 8 milhões de habitantes.
A defesa das nossas fronteiras na Amazônia sempre receberam grande contribuição das comunidades indígenas. Por exemplo, pela incorporação de seus jovens ao Exército para ações em áreas aonde ninguém quer ou sabe ir.

Assim, não há razão concreta, de natureza social ou de segurança, para desconstituir a terra indígena Raposa Serra do Sol. A decisão do Supremo, seja qual for, dirá algo relevante sobre o compromisso do Estado na defesa de uma das principais raízes de nossa identidade cultural, e sobre seu dever de protegê-la, mesmo contrariando interesses ou remando contra marés de incompreensão momentâneas.

O Estado brasileiro vem a duras penas tentando dar conta de seu dever na questão indígena. A Constituição de 1988 foi o grande teste do Legislativo. O Executivo vem tomando medidas importantes, embora acumule enorme passivo.

Agora, está nas mãos do Judiciário. Este é, talvez, o teste mais importante até aqui porque ratificará o que foi alcançado ou abrirá um caminho de grave retrocesso.

Marina Silva


FSP, 04/08/2008, Opinião, p. A2.

Direitos Constitucionais dos Índios - Texto de Dalmo Dalari

Para os índios brasileiros, a terra não é um valor econômico, mas um bem essencial para sua sobrevivência. Isso é muito diferente da concepção dos que invadem áreas indígenas visando aumentar o patrimônio sem pagar pelas terras de que se apossam ilegalmente, sem consideração de ordem ética e sem respeito pela vida e pela dignidade dos seres humanos que são os índios.

Para indignação dos brasileiros que respeitam a Constituição e os princípios e as normas nela consagrados, autoridades públicas que deveriam ser um padrão de dignidade e honestidade acobertam e auxiliam os grileiros das terras indígenas, simulando preocupação com o Direito, a Justiça e a soberania nacional, mas, na realidade, colaborando para a espoliação do patrimônio público e a consumação de inconstitucionalidades.

Foi com a colaboração de autoridades públicas que invasores de áreas indígenas criaram por lei estadual falsos municípios, sem existência legal, pois não foram cumpridas as exigências expressas no artigo 18 da Constituição para a criação de municípios.
Uma vez mais o Supremo Tribunal Federal deverá tomar uma decisão em ação judicial movida com o propósito de anular a demarcação de área indígena feita com absoluta regularidade, apoiada em laudo antropológico e rigorosamente dentro da lei.

Trata-se do caso da área indígena Raposa/Serra do Sol, vizinha ao Estado de Roraima, há séculos ocupada por etnias indígenas. A decisão que for tomada poderá ter o efeito gravíssimo de anular todas as demarcações de áreas indígenas feitas até hoje com rigor técnico e estrita obediência a regras constitucionais e legais.

Se isso ocorrer, haverá muitos conflitos e as conseqüências poderão ser gravíssimas, dando margem à acusação, já feita anteriormente, de que, no Brasil, se pratica o genocídio indireto. Se o STF cumprir sua função de guarda da Constituição, isso será evitado.
Antes de tudo, dispõe a Constituição, no artigo 20, inciso XI, que são bens da União "as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios". No artigo 231, são fixadas duas normas fundamentais relativamente a essas terras que são de propriedade da União.

O parágrafo primeiro do artigo 231 deixa claro o sentido dessa ocupação: "São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições". O parágrafo segundo dispõe: "As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes".

Como fica mais do que óbvio, a ocupação indígena não se limita aos agrupamentos das habitações em que dormem, mas abrange toda a área onde os índios obtêm o indispensável para sua sobrevivência digna, colhendo os frutos da natureza, plantando, criando gado ou pescando, dependendo das condições de cada região.

Além disso, é na área circundante às habitações que o índio identifica, colhe e utiliza plantas medicinais, bem como o material necessário à edificação das casas e à fabricação de roupas, utensílios, enfeites e objetos destinados aos seus rituais, como também suas armas. Ainda mais, é nesse espaço circundante que eles enterram os seus mortos, pelos quais têm grande respeito e veneração.

Por tudo isso, a demarcação das terras indígenas é, necessariamente, de áreas contínuas, em rigorosa obediência à norma constitucional que define como indígenas todas as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, não havendo um só caso de ocupação de "ilhas", deixando intervalos vagos, sem ocupação, entre um e outro espaço ocupado por aldeamentos.
Assim sendo, é absurda e inconstitucional a pretensão de anular a demarcação de áreas contínuas, abrindo espaço para que aventureiros sem escrúpulos, agredindo a Constituição, criem barreiras entre as aldeias da mesma etnia.



Dalmo de Abreu Dallari, 76, advogado, é professor emérito da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo). Foi secretário de Negócios Jurídicos do município de São Paulo (gestão Luiza Erundina).


FSP, 23/08/2008, Tendências/Debates, p.A3.

Os Índios e as Nossas Fronteiras - Texto de Rúbens Ricúpero

"Descobri que também eu era índio quando encontrei os ianomâmis. Tive depois profunda piedade ao ver a que lastimável abandono condenamos esses nossos irmãos brasileiros: sem alimentos, sem remédios, entregues à violência de garimpeiros e bandidos."

Não ouvi essas palavras comoventes de nenhum antropólogo ou idealista de ONG. Elas me foram ditas, 27 anos atrás, por um militar disciplinador, terra-a-terra, homem prático e sensato. Foi em Belém, na sede da 1ª Comissão Demarcadora de Limites, que seu então chefe, o saudoso coronel Ivonilo Dias Rocha, sertanejo cearense com cara de índio, me relatou sua experiência. Ele acabava de retornar de campanha demarcatória na fronteira do Brasil com a Venezuela, nessa Roraima do noticiário.

Como chefe do Departamento das Américas do Itamaraty e antes responsável interino pela Divisão de Fronteiras (ilustrada por Guimarães Rosa), lidei no dia-a-dia com as duas comissões demarcadoras, a de Belém-Manaus e a do Sul, da fronteira da Bolívia ao Chuí. Chefiadas por oficiais da reserva do Exército especialistas em topografia e medições, sempre estiveram sob o comando do Itamaraty.

Jamais ouvi sombra de queixa de nenhum demarcador sobre suposto entrave criado por reservas fronteiriças ao trabalho de demarcação ou inspeção das fronteiras. Boa parte de tal serviço se fazia com a indispensável colaboração dos conhecedores do terreno, os índios que serviam como guias, canoeiros, transportadores. O coronel Ivonilo teve a revelação de sua profunda identidade indígena ao ajudar e ser ajudado pelos índios na fronteira. Pertencia à tradição do Exército do marechal Rondon, positivista, neto de bororos, que preferia: "Morrer, se preciso; matar nunca".

Ao investir contra moinhos de vento de fantasista ameaça à soberania oriunda das reservas fronteiriças, os quixotes não vêem os crimes diários que se cometem contra a Amazônia e seus habitantes, caboclos ou indígenas. Centenas de milhares de quilômetros quadrados de biodiversidade florestal reduzidos a fumaça, dezenas de trabalhadores, índios, missionários assassinados por pistoleiros comovem menos que a compra de hectares de mata por alguma ONG estrangeira desejosa de proteger a natureza.

Os índios não têm a propriedade das reservas. Não podem vender ou alugar a terra; dela só possuem o usufruto. Já os grileiros que ateiam fogo para se declararem donos desejam a propriedade exclusiva e gratuita. Quase sempre para fins especulativos ou ações predatórias como a pecuária extensiva, que degrada e abandona os solos.

Em nenhum outro lugar se está tão próximo da frase de Proudhon: "A propriedade é o roubo".
O próprio Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) declara que a situação fundiária da maioria das terras é irregular. É generalizado o esbulho praticado por particulares contra o que devia ser de todos os cidadãos. Às vezes, a única diferença entre diversos tipos de esbulho é sua antigüidade. Remontam alguns aos tempos em que terras devolutas eram distribuídas a políticos e desembargadores como brinde de Natal.

Não é preciso olhar debaixo da cama para ver se alguma sinistra ONG estrangeira está ali escondida. As ameaças à nação estão diante de nós: grileiros, incendiários, madeireiros ilegais, latifundiários, pistoleiros. A eles, senhores defensores da soberania nacional!



Rubens Ricupero, 71, diretor da Faculdade de Economia da Faap e do Instituto Fernand Braudel de São Paulo, foi secretário-geral da Unctad (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento) e ministro da Fazenda (governo Itamar Franco).


FSP, 25/05/2008, Dinheiro, p. B2.

Na Terra do Sol - Texto de Mírian Leitão

A Raposa Serra do Sol é um desafio múltiplo para o país. É assunto complexo, delicado, perigoso. No embate, o Brasil revela seus defeitos e erra com os índios: ora por preconceito; ora por paternalismo. A terra sem lei que é a Amazônia está explícita no caso do fazendeiro, com jagunços e armas, apoiado pelo governador. A absolvição do mandante da morte de Dorothy Stang confirma que, na região, o crime tem vencido.

Quando o general Heleno fez seu desabafo, ajudou a revelar o que muitos pensam dentro das Forças Armadas. Melhor que ele fale em público. O general comanda 25 mil homens na Amazônia, deve ter liberdade de exprimir seus pensamentos. Mas, quando for tomada a decisão pelo poder civil, ele vai cumpri-la; certamente.

O general Heleno tem razão quando diz que a política indigenista do Brasil é uma bagunça. Ela tem um defeito original: trata os índios como se todos estivessem no mesmo estágio; os que nem falam português e aqueles completamente integrados recebem o mesmo tratamento paternalista por parte da Funai, como se fossem incapazes, não soubessem o que fazem.

O debate revelou outro flanco, perigoso: o preconceito contra índios. Nem "bom selvagem", como o pensamento idílico de alguns; nem estrangeiros, como tantos fizeram crer. Muitos disseram que, se as terras ficarem com os índios, a integridade territorial brasileira estará ameaçada. Isso revela a idéia esquisita de que grileiros não ameaçam a segurança nacional; mas índios, sim. De que Paulo César Quartiero, com seus capangas encapuzados e bombas, garantiria a integridade do país, mas os índios, num território contínuo, seria a perda de um pedaço do Brasil.

Temer o uso da expressão "nações" para definir as várias etnias indígenas só ameaça a ilusão de um país homogêneo. O Brasil não é homogêneo. Deve ser unido em sua diversidade, respeitadas as diferenças. O Canadá chama os grupos indígenas de first nations, ou seja, primeiras nações, e não foi isso que ameaçou a unidade do Canadá.

O importante é que a bandeira brasileira seja sempre soberana e esteja sobre todos os grupos, etnias, estados. Fundamental é que as Forças Armadas tenham trânsito livre em todo o território nacional. As terras das reservas são da União; os índios têm apenas o usufruto. Mas têm cuidado bem delas. Os dados de satélite provam que as reservas indígenas são hoje áreas mais preservadas que as outras áreas. Às vezes, são manchas verdes cercadas de feridas na mata.

Nem sempre é assim. Há índios e índios, como em qualquer outro grupo humano.
Ano passado, entrevistei dois líderes indígenas do alto Rio Negro: Domingos Tukano e André Baniwa. Eles estudaram, usam a internet, e preferem ficar com suas tribos e ajudá-las a preservar sua cultura, ainda que admitam que a cultura não é estática. Moram em pontos diferentes do extremo norte do Brasil. Para chegar em suas aldeias, têm que viajar até São Gabriel da Cachoeira, a 860 quilômetros de Manaus e, de lá, seguir de barco por, no mínimo, uma semana, se for voadeira. Morando em áreas tão remotas, estão ajudando a garantir a integridade territorial brasileira, e não o contrário.

O mesmo argumento valeria para Quartiero - ou para qualquer outro brasileiro que se disponha a estar em partes extremas e remotas do Brasil - desde que eles cumpram as leis, adquiram suas terras legalmente e não sejam predadores da floresta.

O governador de Roraima está a favor do fazendeiro e pediu o respeito à lei por parte dos índios, mas não viu o flagrante desrespeito à lei cometido pelo fazendeiro-prefeito. A Polícia Federal prendeu Quartiero, mas o governo não registrou que os índios não poderiam ter ido àquela área enquanto a questão estava sendo discutida pela Justiça. Deveriam ter aguardado a decisão do Supremo Tribunal Federal. Os 300 índios que estão acampados em frente à fazenda também estão errados. Ambos, arrozeiros e índios, devem obediência ao mesmo STF. Neste caso, erram os dois. E o governo deve estar preparado para fazer cumprir a decisão do Tribunal, seja qual for. Deve admoestar tanto os índios quanto os arrozeiros, que é isso que se fará.

A questão das reservas indígenas terá que ser enfrentada pelo Brasil de forma atualizada e sem preconceitos. O conflito vai se acirrar daqui em diante. O país tem o direito de se perguntar se as reservas são excessivas. Em alguns casos, talvez sejam, sim. A Funai precisa tornar mais efetiva sua ação. O Incra também tem que dizer, em algum momento, a que veio.

Um fazendeiro com quem conversei recentemente na Amazônia admitiu que a maioria das terras deles e de seus amigos não eram exatamente legais, mas me perguntou:

- Por que, em 40 anos, o Incra não foi capaz de pôr ordem nesta bagunça fundiária?

O que está em jogo na Reserva Raposa Serra do Sol é o conflito de terras na Amazônia, e não o dilema de integrar o país ou entregar para os índios. Está em jogo é a capacidade do Estado de fazer cumprir as leis do país naquela vasta e preciosa região. O assassinato de Dorothy Stang mostra a força do crime que está destruindo a Amazônia. Se os punidos forem apenas os pistoleiros mandados, teremos escolhido deixar o crime vencer. O STF pode decidir o que for sobre Raposa Serra do Sol, mas que os ministro não se deixem influenciar pela idéia difundida neste debate de que os índios não são brasileiros e nos ameaçam.

Se for isso, o país terá escolhido o retrocesso.



O Globo, 11/05/2008, Panorama Econômico, p. 38.

O "jardim antropológico" é uma insensatez - Texto de Hélio Jaguaribe

Todos os países americanos se confrontaram com a questão indígena. É indiscutível que em todos eles a relação entre europeus colonizadores e a população nativa foi originariamente conflituosa. Esse conflito conduziu ao extermínio das populações costeiras (Brasil), levando os nativos a se refugiarem no interior remoto de cada um desses países.

É a partir sobretudo do século 19 que se diferenciam a conduta dos europeus e a de seus descendentes nas Américas. Nos EUA, a opção da população branca foi o extermínio dos nativos: "a good indian is a dead indian".

O Brasil não teve política indigenista até o início do século 20. O índio foi romantizado por José de Alencar e outros. Mas a conduta real, por parte dos que se adentraram pelo Oeste, foi de espoliação das terras indígenas, com violenta expulsão dos nativos.

A política indigenista no Brasil não foi, originariamente, formulada pelo governo federal, e sim por esse grande pioneiro que foi o general Rondon.

Encarregada da extensão das linhas telegráficas até Cuiabá, a Missão Rondon, como foi designada, se defrontou com as populações indígenas do interior do país. A política adotada por Rondon foi a de total respeito aos índios, reconhecidos como legítimos proprietários das terras.

Meu saudoso pai, general Francisco Jaguaribe de Mattos, então jovem capitão, foi o geógrafo e cartógrafo da missão. Dele tenho narrativas diretas de como se procedia então. Seus membros, nos freqüentes encontros com os índios, os abordavam pacificamente, incorporando os que desejassem. O lema de Rondon era: "Morrer se necessário, matar, nunca".

A política indigenista de Rondon partia do suposto de que o índio era o brasileiro nativo, que devia ser tratado respeitosamente pelos civilizados e induzido, pacificamente, a se incorporar à cidadania, recebendo conveniente educação e assistência.

A República manteve a política indigenista de Rondon. De acordo com suas idéias (ele mesmo tendo ascendência indígena), estimava-se que, gradualmente, a total população indígena, ora da ordem de 700 mil entre 190 milhões de habitantes, seria incorporada à cidadania brasileira.

Em anos mais recentes, a política indigenista brasileira passou a ser orientada por etnólogos.
Estes, diversamente de Rondon, não intentavam a pacífica incorporação do índio, mas a preservação das culturas indígenas. Para isso, adotou-se a prática da delimitação de amplas áreas nos sítios povoados por índios, como reservas.

A política de reservas vem sendo aplicada sem levar em conta os imperativos de defesa nacional, o que ocorre nos diversos casos em que elas se estendem até nossas fronteiras com países vizinhos. As autoridades militares têm alertado o governo, com toda a razão, sobre o perigo da prática.

Por essas e outras razões, a política indigenista brasileira requer uma urgente a ampla revisão. Desde logo, independentemente da nova orientação que se lhe dê, é preciso estabelecer uma faixa que acompanhe as fronteiras do Brasil com outros países e dela excluir as reservas indígenas. Em termos mais amplos, importa questionar: que objetivos deve ter tal política, ademais da proteção do índio?

Por outro lado, a perpetuação de culturas nativas, em que se fundamenta, no Brasil, a política de reservas, carece de sentido. Em termos antropológicos, pois é impossível sustar o processo civilizatório. As populações civilizadas do mundo são descendentes de populações tribais, que seguiram, em todos os países, o secular caminho que leva paleolíticos a se transformarem em neolíticos e estes, em civilizados. Criar um "jardim antropológico", à semelhança de um jardim zoológico, é uma insensatez. Cabe ao governo federal zelar pela unidade do país, e não contribuir para autonomizar supostas nações indígenas que, no limite do caso, poderiam apelar para a ONU para lhes salvaguardar a independência e ser objeto de penetração estrangeira.

A nossa política indigenista não pode ter outro objetivo senão o da incorporação pacífica do índio à cidadania brasileira, para tal lhe dando toda a assistência requerida: sanitária, educacional e profissional.



Helio Jaguaribe, 85, sociólogo, é decano emérito do Instituto de Estudos Políticos e Sociais (RJ), membro da Academia Brasileira de Letras e autor de, entre outras obras, "Um Estudo Crítico da História".

FSP, 26/04/2008, Tendências/Debates, p. A3.

Grande perigo é balcanizar a Amazônia - Texto do Gal. Luiz Gonzaga Lessa

Há um grande perigo em gestação na fronteira Norte do País: a balcanização da Amazônia,, ou seja, a transformação daquela vasta região em algo semelhante ao que ocorreu no Kosovo, nos Bálcãs, com conseqüente risco à soberania brasileira. Este tema tem muito a ver com a tentativa de transformar toda aquela área, onde vive boa parte das nações indígenas brasileiras, em uma nação distinta do Brasil.

Isso tem muito a ver com a influência estrangeira sobre os índios, tema que está no fulcro do projeto apresentado pela Secretaria Nacional de Justiça. O pior é que este atentado não tem sido coibido pelo governo, que, obviamente, percebe o risco, mas tem se omitido e não de agora.

Esse perigo, sobre o qual temos alertado toda a sociedade brasileira há mais de dez anos, tem a ver com a Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, aprovado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 13 de setembro de 2007. Essa declaração é quase o ato final de um persistente processo que, nos últimos 20 anos, tem sido levado a efeito por influentes e bem estruturadas organizações não-governamentais (ONGs).

Caso a Declaração venha a ser referendada pelo Congresso, ganhará força de emenda constitucional, conforme prevê a própria Constituição Lembro que a Lei Maior diz, no seu artigo 5.º, que tratados internacionais referentes a direitos humanos referendados pelo Congresso passam a valer como emendas constitucionais. Em tese, nada impediria que algum destes vários líderes indígenas, muito bem instruídos e preparados, declarasse a independência de sua 'nação', apartada do Brasil.

A se confirmar essa tendência, teremos retalhado o Brasil em 227 nações, com 180 diferentes idiomas. O crime contra o Brasil e sua soberania e unidade territorial terá sido perpetrado. Onde está a sociedade civil que não se manifesta?


Comandante militar da Amazônia até 1998 e ex-presidente do Clube Militar

OESP, 25/04/2008, Nacional, p. A14.

Alarmismo - Texto de Mércio P. Gomes

Por mais inverossímil que pareça, o STF poderá levar a nação brasileira a um retrocesso sem precedentes na história do indigenismo nacional. As declarações proferidas por alguns ministros antecipam uma grave mudança na terra indígena Raposa Serra do Sol, desmembrando-a em "ilhas" para acomodar sete arrozeiros que nela penetraram ilegalmente alguns anos atrás. A justificativa para tal ato seria o perigo à integridade territorial brasileira pela existência de terras indígenas nas nossas fronteiras e pela presença ostensiva de ONGs na Amazônia.

Do lado militar, o chefe do Comando Militar da Amazônia prossegue em franca campanha de atemorização nacional pela presença de terras indígenas em fronteiras, de estrangeiros na Amazônia e da possibilidade de entrarmos em guerra contra algum inimigo fronteiriço ou internacional.

O alarme reverbera na opinião pública. Ninguém parece se lembrar do papel dos índios na História brasileira, especialmente na inclusão de Roraima ao território nacional.
Esquecem-se os militares de um de seus maiores patronos, o Marechal Rondon, que escreveu, em 1910, que os índios "são nações autônomas, com as quais o Brasil deve ter relações de amizade".

Quem era Rondon? Um venda-pátria, ou um dos maiores patriotas que a nação já teve? Para Rondon os povos indígenas são parte essencial da nação brasileira. Chamaos de nações no mesmo sentido que o Canadá chama seus povos indígenas de first nations, isto é, primeiras nações. Será que o Canadá põe em perigo sua soberania ao chamar seus povos indígenas de nações?

Nunca na História brasileira o nosso território sofreu perda para outro país, muito menos por causa dos índios. Ao contrário, foi pela aliança de alguns povos indígenas com os portugueses que partes substantivas do nosso território passaram a pertencer ao que hoje é o território nacional.
Todos que almejam ver um Brasil digno e respeitado têm que começar respeitando os povos indígenas, os primeiros brasileiros. O STF não pode voltar atrás na homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol, não só pelo ato já realizado, mas pelo que a homologação representa como ato jurídico que oficializa o reconhecimento do Estado e da nação sobre as terras indígenas. Nos últimos cem anos, 600 segmentos do território nacional foram reconhecidos como terras indígenas e todas elas pertencem integral e constitucionalmente à União brasileira.



Mércio P. Gomes é antropólogo e foi presidente da Funai

Autor: Mércio P. Gomes
Data de publicação: 28/04/2008
Fonte: O Globo

Mitos e Lendas sobre Raposa Serra do Sol - Texto de Marcelo Leite

Apesar das intenções e declarações atribuídas aos ministros Carlos Ayres Britto e Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, é muito improvável que o STF anule os efeitos do decreto de 2005 da Presidência da República que homologou a Terra Indígena Raposa Serra do Sol (TIRSS, para simplificar) de modo contínuo.


Lula, FHC e o contraditório

O processo administrativo de identificação, demarcação e homologação da TIRSS durou mais de 15 anos. Nesse quarto de século, sofreu todo tipo de contestação. Cada uma delas foi sendo derrubada nas várias esferas, inclusive no Supremo (só neste ano o ministro Ayres Britto deu duas decisões contrárias aos contestadores). O decreto homologador de Lula não foi o início, mas sim o coroamento do processo, que formalizou o que havia sido preparado mas não concluído por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso.

Este, aliás, é um dos mitos que cerca a TIRSS. Blogs tucanos dizem que FHC demarcou a terra em ilhas e que Lula voltou atrás, mas não é verdade. Nelson Jobim, quando ministro da Justiça de FHC, de fato baixou portaria desmembrando a TIRSS, mas seu sucessor Renan Calheiros, ainda no governo FHC, revogou a portaria e reconstituiu a reserva contínua.


Integridade territorial

Tampouco é verdade que a TIRSS, por estar em área de fronteira, implica perda de soberania sobre a terra e ameaça à integridade territorial, como se apressam a afirmar deputados e blogueiros mais ou menos próximos do PCdoB e de militares ultranacionalistas (e antiindígenas). O decreto de homologação, que completa três anos amanhã, afirma em seu artigo 4o:

"É assegurada, nos termos do Decreto no 4.412, de 7 de outubro de 2002, a ação das Forças Armadas, para a defesa do território e da soberania nacionais, e do Departamento de Polícia Federal do Ministério da Justiça, para garantir a segurança e a ordem pública e proteger os direitos constitucionais indígenas, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol.

"Parágrafo único. As Forças Armadas e o Departamento de Polícia Federal utilizarão os meios necessários, adequados e proporcionais para desempenho de suas atribuições legais e constitucionais."

Quem se der ao trabalho de consultar o decreto no 4.412 acima mencionado, verificará que militares e policiais federais não precisam "pedir licença para os índios" para lá entrar. Só para a Secretaria-Executiva do Conselho de Defesa Nacional, e isso quando quiserem instalar unidades militares e policiais nas reservas (art. 2o). Esta, por sua vez, "poderá solicitar manifestação da Fundação Nacional do Índio - FUNAI acerca de eventuais impactos em relação às comunidades indígenas das localidades objeto das
instalações militares ou policiais".


A TI Yanomami, homologada há quase 16 anos com área cinco vezes maior e também na fronteira, não se tornou uma nação indígena independente. Era o que alegava campanha que teve larga publicidade nos anos 1980 no jornal O Estado de S. Paulo. Há na área dois pelotões de fronteira, em Surucucu e Auaris. Na TIRSS há outros dois, em Uiramutã e Pacaraima.


Soberania e ONGs estrangeiras

Boa parte dos textos retrógrados publicados contra a TIRSS, na prática, negam a condição de brasileiros aos 15 ou 18 mil macuxis, taurepangues, ingaricós, patamonas e uapixanas que ali vivem. Aliás, como lembrou em entrevista de 15 min à TV Estadão a advogada especializada em direito sócio-ambiental Ana Valéria Araújo, do Fundo Brasil de Direitos Humanos, Roraima só é do Brasil porque Joaquim Nabuco defendeu sua posse, em disputa com a Inglaterra, com base justamente a presença de índios brasileiros por lá. (A entrevista, de resto, é uma aula imperdível.)

Reconhecer aos índios, juridicamente, a óbvia posse da terra que ocupam antes de qualquer "brasileiro que paga imposto" (= não-índio), por aquela lógica estreita, equivale a ceder soberania para estrangeiros. Deve ser porque o Conselho Indígena de Roraima (CIR), em março de 2004, aliada à ONG Rainforest Foundation, dos EUA, denunciou o Estado brasileiro à Organização dos Estados Americanos (OEA) por violação aos direitos indígenas. Como narram Egon Heck, Francisco Loebens e Priscila D. Carvalho no artigo "Amazônia indígena: conquistas e desafios", "em 6 de dezembro de 2004 a Comissão Interamericana de Direitos Humanos recomendou ao Governo do Brasil quatro medidas:

proteger a vida e a integridade pessoal dos povos indígenas Ingaricó, Macuxi, Patamona, Taurepang e Wapichana, respeitando sua identidade cultural e sua especial relação com o território ancestral;
assegurar que os beneficiários possam continuar a habitar suas comunidades, sem nenhum tipo de agressão, coação ou ameaça;
abster-se de restringir ilegalmente o direito de livre circulação dos membros dos povos
indígenas Ingaricó, Macuxi, Patamona, Taurepang e Wapichana; investigar séria e exaustivamente os fatos que motivaram o pedido de medidas cautelares".

Em outras palavras, o que os inimigos da TIRSS acusam de ser um complô internacional contra a soberania brasileira, na realidade, é uma tentativa de usar pressão de um organismo multilateral do qual o Brasil faz parte para que o país cumpra a sua própria Constituição, no artigo 231: "São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens".


Fazendeiros produtivos x índios primitivos

O mesmo artigo 231 afirma em seu parágrafo 6o: "São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé".

O que poucos sabem, porque não se diz, é que a maioria dos ocupantes de terras indígenas - ocupação essa inciada quando as terras já estavam em processo de identificação e demarcação - aceitou indenização pelas benfeitorias e deixou a área. Havia coisa de 200 unidades de produção, das quais restaram umas 60. Entre elas, os seis arrozeiros que, segundo o governo estadual de Roraima, respondem por 6% do PIB do Estado (não há notícia de que o governador tucano José de Anchieta Júnior tenha feito
cálculo similar para informar quanto representa a atividade econômica dos 15 ou 18 mil índios da TIRSS, que têm por exemplo 50 mil cabeças de gado por lá).


Terra demais para índio

Usando apenas dados disponíveis na internet, é possível fazer algumas contas interessantes sobre a alegação de que 17.475 km2 para 15 ou 18 mil índios é terra demais para eles.

O Estado todo tem 224.298,980 km2 e 391.317 habitantes. Isso dá 0,57 km2/hab. A população da TIRSS é de 18.751 pessoas, mas suponhamos que só 15 mil sejam de fato índios - eles teriam portanto, algo como 1,17 km2/hab, só duas vezes mais que a média do Estado. Agora considere a argumentação de que os 60 agricultores nas terras indígenas ocupem "só" 1% da reserva, ou cerca de 180 km2. Dá 3 km2/pessoa, bem mais que o quinhão dos verdadeiros donos da terra - ou alguém dúvida de que os índios chegaram antes?


Precedentes no STF e em MS

Se for para duvidar de alguma coisa, é mais prudente duvidar de que o STF volte atrás em todas as suas decisões anteriores e anule o decreto de homologação de 2005, desmembrando a TIRSS. Seria preciso demonstrar como isso atenderia melhor ao art. 231 da Constituição, ou provar que o processo de demarcação conduzido pela Funai e pelo Ministério da Justiça ao longo de 15 anos ocorreu em desacordo com ele, com outras partes da Constituição ou com a legislação que disciplina esse tipo de ação administrativa.


Autor: Marcelo Leite
Data de publicação: 14/04/2008
Fonte: Folha Online-Blogs-Ciência em Dia

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Vidas humanas não podem valer menos que toda a energia de Itaipú Binacional

Em 1982, alguns meses antes da inundação que ocuparia 2.430 km², engolindo Sete Quedas e dezenas de outros rios e córregos da bacia do rio Iguaçú, uma aldeia indígena de quase 100 índios recebeu a notícia que iriam ser transferidos para outro local.

O projeto foi “magnânimo” com Fauna e Flora. De fachada, fizeram muitos filmes de equipes de biólogos recolhendo alguns exemplares de fauna que, para a biodiversidade da região, quase nada significou.

Da mesma forma, estudos apressados de Flora foram feitos para se preservar espécies endêmicas. Mas, com os índios Avá Guarani, foi bem diferente. Aliás ele nem são citados no projeto da usina.

Quando lembrados, deram-lhes um pequeno pedaço de terra. Depois da inundação, os índios perceberam que haviam caído numa armadilha. Mais da metade da pequena terra dada como indenização à inundação do território de sobrevivência indígena, estava debaixo d’água, como disse o Cacique Simão Tupã Retã Vilialva

Hoje, depois de 24 anos de penúria, de fome, de doenças, de mortes, pouco mais de 600 pessoas, em sua maioria constituída por crianças, impelem aos líderes Avá Guarani ao clamor de justiça.
Vivendo em dois grupos próximos, no município paranaense de São Miguel do guaçú, os índios passam por um período decisivo em suas vidas. Cansados e descrentes dos embates com a FUNAI e o IBAMA, principalmente, esse grupo de indígenas vem agora se movendo em direção à imprensa para que sua mais que reconhecida causa seja divulgada e atraia a atenção da sociedade e das autoridades, pois disso depende a sua sobrevivência.

A história dos Nhandeva-Ava-Guarani do Paraná é uma verdadeira saga. Esse grupo de índios são da mais antiga etnia verificada no Paraná (aliás, deveria ser Paranã). Foram os Nhandeva-Avá Guarani que construíram o famoso Caminho de Peabirú, há mais de dois mil anos e que liga o Oceano Atlântico ao território Inca, passando por Guarapuava. Uma trilha que ainda pode ser percebida em alguns trechos onde a ganância capitalista não transformou em pasto ou em soja. Uma enorme quantidade de relatos históricos prova que esse povo, assim como os Mbyá e Kaiová foram os pioneiros na América Latina. Famílias inteiras foram destroçadas pelos espanhóis no século XIX. Eram chamados de Itatines ou Itatins pelos portugueses. Itatim significa “ nariz de pedra “, gente sem sensibilidade, porque não aceitaram a conversão ao cristianismo. Foram perseguidos pelos bandeirantes escravagistas. Pois, não tinham o salvo conduto da conversão.

Antes mesmo da construção de Itaipu, eles já sofriam diferentes formas de violência. Com a acelerada ocupação branca no Oeste paranaense “os Avá Guarani tinham as casas queimadas, o que os obrigava a emigrar”, diz o relatório do Grupo de Trabalho da Itaipu Binacional (GT) e a FUNAI, de 20 de maio de 1994.

Em 1982, os índios foram assentados na área do Ocoi (Oco’y), numa faixa estreita de terra, o que sobrou da inundação, às margens do lago formado pela barragem. Eram proibidos pelo IBAMA de derrubar qualquer arbusto para lenha, pois a vegetação em seu redor, nada mais era que a mata ciliar do Lago de Itaipu.

Nesses 24 anos de assentamento, não há nada a comemorar. “Ao invés de esperança, temos a morte batendo à nossa porta”, disse Antônio Cabreira, um dos líderes da Aldeia. A indignação dos moradores de Oco’y tem justificativa. São inúmeros os problemas enfrentados pelo grupo que vão desde a poluição do lago por agrotóxicos proibidos à mendicância. Quando os índios foram assentados eram 11 famílias e hoje chegam a 140. O grupo que era de menos de 100 pessoas, conta agora com mais de 600, sendo que 250 são crianças com idades entre 0 a 5 anos.

“A pequena extensão de terra não permite a nossa subsistência”

Em termos agrícolas, as famílias possuem pequenas áreas de plantio. Apenas 3 cultivos por temporada são plantados, o que torna impossível fazerem rotação de culturas. Plantando há 24 anos nos mesmos locais, podemos ter uma idéia da imprestabilidade da área. Não há caça nem muita coleta. A pesca é contaminada por agrotóxicos que escorrem das fazendas vizinhas, inexistindo qualquer vigilância por parte do IBAMA em relação à poluição do lago.

As aspersões de agrotóxicos são feitas por aviões agrícolas, facilmente notados nos aeroportos das fazendas. Os venenos são contrabandeados, em sua maioria, do Paraguai. São substâncias altamente nocivas que, regularmente, provocam mortandade de peixes. Os agrotóxicos, com as chuvas, descem para as terras guaranis e contaminam as nascentes de águas potáveis.

Desta forma, os índios estão sendo contaminados dia após dia, assim como os animais, as terras, e a sofrida agricultura familiar. A contaminação do lago tem deixado a população doente, principalmente as crianças que já sofrem com doenças até então desconhecidas, alergias como sarna que chegam a atingir até as crianças de colo.

Além da falta de alimentos, a educação também é precária. A escola da comunidade só ensina até a quarta série. O resultado são 170 alunos fora da escola.

Por tratar-se de uma área de reserva ambiental, os índios são perseguidos e impedidos de plantar, embora licenças especiais já tenham sido pleiteadas e até hoje não foram respondidas. O artesanato, outra parte importante da cultura Guarani e uma possível fonte de renda, também não se desenvolve pelo mesmo motivo, já que uma boa parte consiste de utensílios e objetos de madeira.

Os colonos que habitam os lados de cima da bacia estão muito próximos da aldeia, o que por lei é ilegal. O que separa a estreita faixa de terra indígena das plantações de soja dos fazendeiros é apenas uma estrada. A proximidade e a falta de respeito, não só pelos colonos da região, mas pelo produtores, dá origem a conflitos violentos por causa de invasões. É alto o número de mortes e estupros e o descaso das autoridades torna essa situação inalterável e insustentável.
Como se não bastassem todos esses problemas, os Avá Guarani ainda precisam enfrentar a corrupção. Há poucas semanas um grupo formado pelos membros da recém-formada Associação Comu-nitária Indígena Oco'y - ACICO, encontrou alimentos que a FUNAI vem destinando aos índios apodre-cendo num depósito da Prefeitura de São Miguel do Iguaçú, enquanto os descendentes dos guerreiros de outrora mendigam pelas ruas da cidade, humilhando-se por um pouco de comida para não deixar mais crianças morrerem de fome.

A falta de perspectivas atinge o moral do grupo, desgraçadamente. Sem empregos, muitos migram para o Paraguai em busca de melhores condições de vida. A falta da continuidade dos estudos deixa a população acima dos 10 anos ociosa e acabam sendo “empurradas” à prostituição, crimes e suicídios.

O pleito dos Nhandeva Avá-Gurarani é simples. Terras em quantidade justa à que lhes foi subtraída para o assentamento das famílias, licença para plantio de subsistência e pequena comercialização como fonte de renda, incentivos para a educação e artesanato. Embora o povo esteja indignado, a esperança e os planos persistem. A aldeia vislumbra uma maior área de no mínimo 10.000 hectares, que será 50% reflorestada. Para este local há planos de construção de uma aldeia, nos moldes de 500 anos atrás, e que fará parte do turismo paranaense, e onde os Guarani, possam preservar a sua identidade, mostrando sua cultura, vendendo os seus produtos diretamente aos visitantes. A idéia inclui também a criação de um museu Guarani Nhandeva.
Para a educação das crianças, os planos são de construção de uma escola modelo que atenderá desde a creche até o ensino médio. Há planos também para a construção de uma escola técnica que possibilite a capacitação de mão de obra jovem e uma escola que se dedicará exclusivamente para ensinar o idioma Gua-rani Nhandeva.

Todos esses planos, simples e viáveis, passam a serem arrojados levando-se em consideração o descaso dos órgãos governamentais responsáveis pelas questões indígenas e ambientais, assim como das autoridades locais. Esse povo já demonstrou que foi capaz de viver de maneira sustentável por 500 anos, mas não pode garantir que resistirá a mais 500 anos de descaso, corrupção e hipocrisia.

Mas essa história ainda pode ser mudada. Se você se sensibilizou com a situação dos Ava-Guarani do Oco’y e quiser ajudar a reverter essa situação degradante, há duas maneiras de participar:
Enviar uma contribuição (qualquer quantia) para a Associação Comunitária Indígena Ocoy – ACICO, no Banco do Brasil, agência 1357-9 (São Miguel do Iguaçú – PR), conta corrente no. 5991-9.

Repassar esse email aos órgãos competentes, instituições, ONGs, imprensa, amigos e parentes.

Manifeste sua indignação e cobre providências.

Já que está tão em moda a preocupação com a preservação da biodiversidade, da qualidade do ar, da temperatura da água... porque então não há interesse na preservação de vidas humanas?

(Texto de Heitor Kaiová Karaí Awa-Ruvitcha e Ana Kristina)

União para Vitória

A história nos mostra que sem união, jamais conseguiremos a vitória.

O que é a vitória?

Não queremos tomar o país de volta, mesmo que toda essa área ocupada pelo Brasil tenhan sido habitada e possuída de fato pelos Povos Indígenas por milhares de anos antes da invasão.

Queremos, apenas o nosso digno e justo quinhão.
Queremos a terra onde viveram nossos ancestrais, analisada e avaliada como propriedade indígena, sem a finalidade de revenda ou arrendamento. Porque terra indígena é terra preservada para culturas nativas em pequena escala de produção caracterizada como prática sustentável, sem a gananciosa destruição dos herdeiros dos invasores.

Queremos total acesso às políticas de saúde do Estado.
A grande e esmagadora maioria das doenças exóticas foram trazidas pelos invasores e seus descendentes.
Mesmo as doenças nativas foram potencializadas pelas populações não índias por terem sido tratadas com substâncias alopáticas, permitindo o fortalecimento de vírus e bactérias em relação à época em que os vírus e bactérias das moléstias eram fracos e suscetíveis aos tratamentos da medicina xamãnica, utilizando-se somente a bioterapia natural das florestas.

Queremos educação para acompanhar a evolução de todos os seres humanos do planeta. Até porque, não fomos nós, índios, quem alterou o clima da Terra como a destruição dos biomas naturais.
Pelo contrário, hoje os Txamoys e Payés andam muito para buscar nas poucas ilhas de Biodiversidade preservada, as ervas e espécimes vegetais ou animais que sempre promoveram a cura do nosso povo.

Queremos nossa Florestas de volta.

Logo, o que queremos, são os mesmos desejos de todas as etnias indígenas: Terra, Saúde, Educação e Floresta.
Queremos mais um pouquinho: Respeito e Dignidade para cada Nação Indígena e para cada indivíduo do povo da terra. Pois, não somos brasileiros. Nossos ancestrais estão aqui há milhares e milhares de anos antes de Portugal inventar o Brasil.

Como podemos nos impor?
Basta que esqueçamos as contendas do passado para nos unirmos fortemente como é o caso da
COIAB : Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira.

Hoje, já temos sinais que não se pode adotar uma postura individualista onde cada Nação Indígena luta exclusivamente pelos seus interesses.

E também temos lições de vida deixadas por líderes imortais, como Maninha Xukurú irmanada ao povo Kariri , pesarosamente falecida no dia 11 p. p.
Maninha foi uma ativista e grande incentivadora das Articulações dos Povos Indígenas como bem deixou o seu exemplo nas Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), da qual foi coordenadora até o ano de 2005.
A mesma união que junta Tupinakis e Guaranis em Aracruz - ES, idem entre Guaranis e Kaingangs na região metropolitana de Porto Alegre, conforme depoimento recente da nossa irmã Liana Utinguassú.

Vamos, ainda mais longe. O Payé Antonio Pankararú me contou, de viva voz, como juntou seu povo ao Quilombo Caldeirão, no interior de Pernambuco, não perdendo as culturas indígenas e nem afro-brasileiras.

Portanto a receita, meu querido irmão Payayá é a união.
Constituir-se em Organização para ter voz própria perante a lei deste país e reivindicar, pedir o apoio de ONGSs que realmente sejam sérias e desejam ajudar o Povo Indígena.

Reivindicar e cobrar soluções. Divulgar o descaso, a maldade e a incompetência governamental que se instalou neste país, quando a questão é terra indígena, saúde, educação e Preservação da Biodiversidade Indígena das Florestas.

Não votar em candidato que odeia índios e ter objetivos de crescimento e melhorias como qualquer outro ser humano.

Heitor Kaiová

A Fé e as Obras - Texto de Heitor Kaiová

Jamais fui contra o preparar a terra, o cavar e o revolver, o escolher e o plantar. Até porque a semente requer esse trabalho para o germinar e sem ele nunca haverá o que colher. Mas, existe algo que não aconteceria se não houvesse esperança. É essa palavra que move os corações a confiar em Deus.
Assim, também é com todos os povos originais (os nativos). Logicamente, não existe essa palavra “fé”. Mas existe a palavra ESPERANÇA em todas as línguas nativas e terrenas. Isso é a mesma coisa que Fé.
Espera-se com confiança que, com ajuda das forças superiores, tudo se transforme e aconteça o esperado.
Só não acontece magia ao estalar de dedos. Até o ciclo solar necessita de tempo, da mesma forma que é necessário para a construção de uma casa, o crescimento de uma planta ou o amadurecimento de um fruto. Durante esse período devemos esperar com otimismo.

Coração Kaiová

Eu tenho uma paixão maior como todo homem ou mulher deve ter além da família, da crença que professa, dos amigos, do trabalho etc. Essa minha paixão é admirar e vivenciar a luta das Nações Indígenas para conseguir sobreviver à uma invasão de mais de 5 séculos de destruição dos seus territórios.
Minha bisavó, mãe do meu avô paterno era GUARANI PAÎ-TAVYTERÃ ou KAIOVÁ como os outros povos indígenas os chamavam. Portanto, geneticamente, não sou índio puro. Mas o meu Coração...Ah! Esse é índio puro mesmo!
Por isso, não me conformo com o que foi feito com quase todas as Nações Indígenas no Brasil.
Como vocês sabem, durante esses 500 anos muitas lágrimas nativas rolaram por esta terra. Primeiro foram as falsas demonstrações de amizade, depois a contaminação pelos invasores doentes, estupros, escravidão, castigos selvagens, chacinas, morticínios nas bandeiras, engodos ao jogar povo contra povo indígena, humilhações, convocação indevida para as batalhas e guerras contra outros invasores e vizinhos de fronteira, roubo de terras por fazendeiros ligados a políticos corruptos, assassinatos de lideranças, morte de crianças famintas e doentes, segregação, ironia, deboche, covardia, falta de atenção, tentativas de subornos...Chega né?
Chega a hora de corrigirmos tudo isso. Índio não quer esmola, quer JUSTIÇA, quer sua TERRA DE VOLTA.
Aliás, a Justiça não é levada muito a sério neste país.
Falo e escrevo pelos nossos índios. Aos atrevidos não índios já digo que nenhum índio me deu procuração para dizer:
Queremos nossas terras tomadas a força ou porque mataram nossos pais e avós. Se a União já não pode devolver as mesmas terras, modificadas, destruídas, dadas a um qualquer para exploração indevida, então QUEREMOS A JUSTA INDENIZAÇÃO.
EXIGIMOS REPARAÇÃO DOS MALES CAUSADOS ÀS NAÇÕES INDÍGENAS QUE NEM BRASILEIRAS SÃO. SERÃO POR OPÇÃO, POR VONTADE LIVRE E SEM COAÇÃO.
ISTO É UM DIREITO SAGRADO E RECONHECIDO PELAS NACÕES UNIDAS DO PLANETA.
E por falar em Planeta, cuidem-se senhores "civilizados". Se não aprenderem logo com os índios a viver em harmonia com as Florestas, fontes inesgotáveis de sobrevivência humana, preparem-se para sobreviverem por pouco tempo num Planeta Doente.
Graças à ambição dos invasores que perdura todos estes séculos, aliás piorou muito porque descobriram outras formas de riqueza, este país está ameaçando a sobrevivência dos seus próprios filhos e netos.
A Preservação e o controle do Meio Ambiente é vital para o índio. Jamais este grande risco de desastre ecológico aconteceria se as Florestas, os Rios, o Ar e o Mar fossem guardados ou até manipulados pelos indígenas que, desde pequenos, aprendem quando se tira 1 raiz, planta-se 10. Onde se caça por 1 ano, fica 4 ou 5 sem caçar.
ISSO É SUSTENTABILIDADE RACIONAL.
Heitor Kaiová

Significado do Símbolo



Apresentação dos Significados

1. As 8 flechas em círculo representam a COESÃO dos Povos Indígenas;
2. O círculo amarelo representa o Sol, o Astro que permite a Vida na Terra através de gerações;
3. O Coração representa a Expectativa de Amor Humanitário entre as Raças e Povos;
4. A Silhueta da Cabeça de um índio representa o Espírito Indígena, voltado para sua Cultura;
5. Das 8 flechas, duas têm significado ainda mais relevante: a vertical espelha a DIGNIDADE DO ÍNDIO, o Direito de preservar sua cultura, seu idioma, sua crença e tradições.
A horizontal significa o seu desejo de reconhecimento, bem como o resgate do Território do seu Povo Ancestral, sem que para isso tenha que recorrer à força ou armas e, absolutamente, sem ter que perder vidas humanas.

As demais significam:
Direito de uso total de suas terras, bem como a recuperação total dos seus direitos fundiários;
Direito à alimentação e água pura equivalente ao que encontravam nas Florestas destruídas pelos descendentes dos invasores e novos imigrantes;
Direito à Saúde para atender às famílias indígenas contaminadas pelos descendentes dos invasores e
novos imigrantes;
Direito à Educação Contemporânea, de forma idêntica àquela ministrada aos descendentes dos invasores e imigrantes, bem como à Educação Indígena conforme os prognósticos de seus ancestrais;
Direito de Ampliação de seus territórios conforme o seu crescimento demográfico e Adaptação Justa do Modo de Viver, decorrente da destruição dos recursos naturais, seja nas periferias das cidades ou no campo bem como em áreas degradadas por grileiros e usineiros;
Direito de ir e vir sem custo algum de transporte, de produzir e vender artesanato com ausência total de impostos, de merecer prioridade nos assentamentos de terra, bem como nos Projetos de Agricultura Familiar desenvolvidos pelo Governo dos herdeiros dos invasores que lhes subtraíram a terra.

6.As penas em verde e amarelo significam a Tolerância e o Perdão Indígena ao País que eles precederam. Mas, jamais o esquecimento dos seus Direitos Sagrados.